A)“Bem-aventurados os corações puros!”
A gente se sente imediatamente empolgado por esta palavra. Só um Deus podia usar semelhante linguagem. Ouvindo estas palavras divinas, a alma delicada sente em si a necessidade de realizar essa bem-aventurança. Ver a Deus! sim, ver a Deus de algum modo, mesmo desde este mundo! E é essa a recompensa prometida aos que são puros!
“Bem-aventurados os corações puros, porque verão a Deus.” Como dizer a beleza dessa virtude celestial, semelhante ao lírio branco, embalsama os que a possuem e espalha em volta deles um perfume indefinível.
Ela é bela! porque dá à fisionomia um não sei quê que cativa, que atrai, que subjuga, que faz nascer uma simpatia respeitosa.
É bela! O Próprio Deus sente-lhe o encanto. Ele chama a alma pura sua “Amiga“: “Sois toda bela, ó minha bem-amada, e em vós não há mancha!” Chama-a “sua esposa“: “Vem, minha Esposa, vem, serás coroada!”
É bela! Jesus quis achá-la na terra. Aparecendo na terra, enveredou por uma trilha de humilhação e de opróbrios; mas, do começo ao fim, arrogou-se, como uma compensação, a pureza que sempre o cercou.
Assim, para se encarnar, Ele prepara para si um tabernáculo; Maria lá está! Ele não a deixa antes da idade de trinta anos … e ainda assim será só para encontrar outra alma pura: São João! E essas duas almas virgens segui-Lo-ão até ao pé da Cruz. Quando Ele quiser morrer, quando tudo Lhe faltar, até mesmo a consolação de se sentir objeto das complacências de seu Pai, nos seus derradeiros instantes, a pureza estará e ficará perto Dele!
É bela! É a virtude trazida por Jesus! Só Ele podia fazê-la florescer nos lodos humanos. Semeou-a na terra e, depois, legiões de virgens vieram embalsamar o nosso exílio.
É bela! No Céu tem ela um lugar à parte. As almas virgens, diz o Apocalipse, “seguem o Cordeiro aonde quer que Ele vá!” E São João contempla a legião delas triunfante, cantando um cântico novo que ninguém mais pode aprender.
É bela! A própria impiedade não pode deixar de aplaudi-la. Quantos remorsos, quantas tristezas a vida da pureza não lança no coração das vítimas do prazer! E, enquanto o mundo repele com desprezo aquelas a quem polui, olha com olhos de inveja as nobres almas que atravessam a lama sem se macularem.
B) É a virtude mais bem recompensada! E isso não somente no céu, mas já na terra.
Ela dá ao semblante uma modéstia serena que tem qualquer coisa de angélico.
Dá ao olhar uma limpidez encantadora.
Dá a fisionomia um esplendor que irradia, põe o mais belo brilho numa fronte jovem; supre assim os esquecimentos da natureza, e reveste a pessoa de uma beleza especial que faz pensar no céu.
Dá ao coração uma ternura, uma chama sagrada que só ela pode alimentar. Que dedicação, que sensibilidade num coração puro!
Dá à vontade um poder notável pela luta contínua que exige. Quando conseguimos vencer-nos a nós mesmo, são fáceis as outras vitórias.
Dá à vontade um poder tanto maior quanto, vivendo numa luta contínua, ela haure aí uma energia viril só conhecida dos que souberam vencer-se a si mesmos.
Dá à inteligência esses remígios, esses olhares de águia que confundem. “Bem-aventurados os corações puros, porque verão a Deus.”
Dá ao próprio corpo, cujas energias conserva, esse vigor especial cuja causa Ricardo Coração de leão assim explicava aos Sarracenos admirados: “Sou forte porque sou puro.”
Enfim, dá a liberdade e a alegria.
A liberdade, porque um coração mordido pelo vício carrega grilhões; esses grilhões podem ser floridos, mas nem por isso deixam de fazer um escravo.
A alegria também, porque, quando se cede à paixão má, acaba-se por ficar triste, tremer e desanimar.
A pureza, que não se adquire senão por uma série de lutas vitoriosas, dilata o coração e dá-lhe um alegre surto. O vício quebra as asas; a virtude fá-las abrir-se, trazendo arrojo e confiança.
Conservai, pois, filha, a todo custo, apesar de tudo, apesar das lutas e quiçá das agonias do coração, essa virtude tão preciosa, esse “encanto desconhecido de que ninguém se defende“.
Na Idade Média dizia-se: “Deus só fez duas coisas perfeitas neste mundo: a rosa quando é fresca, e a donzela quando é pura!”
Não percais esse encanto único, ele não se torna a achar mais! Se o corpo se torna o senhor, ainda que só um instante, é a subversão da ordem moral. A todo custo evitai situar-vos entre os seres descoroados!
C) É uma virtude angélica.
Com esta diferença, entretanto, que aquilo que os anjos são por natureza, a alma pura o é por virtude. Os anjos não têm lutas a sustentar, ao passo que vós vos conservais pura com a condição de serdes vitoriosa no combate.
D) É um triunfo.
Triunfo da Fé; porquanto a luta nas obscuridades da terra só é sustentada pela esperança das recompensas futuras. Triunfo do amor. Do amor de Deus primeiro, do qual as almas puras são as “jóias“; do amor humano também, pois só os corações puros sabem amar. O amor repousa-lhes no fundo da alma como uma gota de orvalho do cálice de uma flor; a alma tem o brilho, o perfume e a preciosa virtude dessa gota de orvalho.
A formação da Donzela – Pe. José Baeteman
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