Zélia Guerin e Luís Martin - Modelo de Casal e de Pais Católicos |
A bela e inspiradora história do casal Martin, pais de Santa Teresinha do Menino Jesus.
“Bastava olhá-los para saber como rezam os santos”
Santa Teresinha do Menino Jesus.
Sr. Luís Martin
Nascido em Athis, no departamento do Orne, o pai do Sr. Martin havia participado das guerras napoleônicas e permanecera no exército mesmo depois de Waterloo. Como mudava frequentemente de guarnição, o seu terceiro filho, Luís, nasceu em Bordeaux, em 1824. Ao aposentar-se, o capitão Martin fixou residência em Alençon, não longe de sua terra natal. Tão bom Cristão quanto bom soldado, não brincava em serviço; exato em tudo, não cometia nenhuma infração a regra.
Legou ao seu filho Luís uma piedade quase militar, e este preservaria a compostura de um oficial até os seus últimos dias. Luís era alto, de porte ereto, e jamais virava a cabeça; aos vinte anos de idade, tinha a fama de ser o mais belo rapaz do vilarejo. Mas não se fez soldado. Em casa de uns primos de Rennes, assumiu o espírito bretão e a vocação de relojoeiro, um oficio silencioso que lhe veio a calhar.
Fez um estágio de aperfeiçoamento com um amigo do pai, em Estrasburgo, e assim teve ocasião de meditar sobre o tempo, sobre a brevidade das horas. Como tinha um toque de espírito poético e amava o pôr do sol, o hábito de considerar todas as coisas do ponto de vista da eternidade despertou nele o desejo de retirar-se para as montanhas a fim de contemplar a Deus mais de perto e de adorá-lo através da criação.
Um dia - tinha então vinte anos - partiu rumo aos Alpes, fazendo parte do trajeto a pé, parte em carruagem, um semi-turista e um semi-peregrino. A certa altura da viagem, decidiu pedir conselho sobre a sua vocação aos religiosos agostinianos que residiam no convento do Grande São Bernardo, em meio a solidão nevada. No entanto, sabia muito pouco latim para ser admitido como noviço, e ao voltar decidiu aprofundar os seus estudos; o pai deu-lhe o seu consentimento, mas uma doênça acabou por impedi-lo de levar a cabo esse plano.
Um pouco frustrado, mas dócil em face das decepções, retomou por fim a profissão de relojoeiro e, depois de um novo estágio em Paris, abriu uma loja em Alençon. A relojoaria ficava na rua do Pont-Neuf, a alguns passos do rio, e ainda hoje se pode ver o nome Martin na tabuleta, por cima dos relógios e dos pêndulos, das argolas e das bijuterias. Ali Luís viveu, solteiro, até os trinta e cinco anos.
Que pensar deste monje-relojoeiro, de belo rosto, reservado, distinto, culto, com a barba arredondada e bem tratada, que só saía de sobrecasaca e com a cabeça coberta por um chapéu-coco, que percorria as ruas sem olhar para as mulheres - nem mesmo pelo canto do olho -, que parecia sonhar tão pouco com o casamento como com o prazer, que era capaz de tirar um bêbado da sarjeta e reconduzi-lo a casa, que nunca perdia a missa matutina, e que reunia em casa velhos senhores piedosos a fim de estudar com eles os meios mais eficazes de socorrer os indigentes, de reabilitar as almas pecadoras e de ajudar os missionários a promover em todo o mundo o reino de Deus? Este "rato de sacristia" tinha, prestígio mais do que suficiente para abalar a tradicional opinião segundo a qual uma "alma caridosa" só pode ser tola, hipócrita e feia. Acrescentemos ainda, para completar a descrição, que Luís gostava de pescar com anzol e linha.
Sra. Zélia Guérin
Ora, na mesma época, a senhorita Zélia Guérin, filha de um oficial de gendarmaria reformado, vivia com o seu velho pai, o seu irmão Isidoro e a sua irmã na casa da rua Saint-Blaise. Nascera na região e tinha sido educada no Convento da Adoração. Uma irresistível propensão para compadecer-se das misérias humanas a tinha levado a pedir admissão como irmã de São Vicente de Paulo, mas a superiora do Hospital a tinha rejeitado sem dar razões; tal como Luís Martin, Zélia Guérin malograra. Este curioso paralelismo não foi inventado de propósito para embelezar uma lenda piedosa; os fatos são esses, devida e solidamente estabelecidos.
Vindo a faltar o dinheiro em casa, Zélia teve de estrear o ofício de fabricante de rendas. A partir desse momento, podiam vê-la a janela, ocupada em confeccionar peças em renda de Alençon e em projetar sobre o papel os graciosos arabescos que depois seriam tecidos por costureiras profissionais.
Choviam os pedidos, mas Zélia não se dispersava; pelo contrário, recolhia-se mais em Deus. Passou a sonhar com um esposo que se preocupasse tanto com ela pela Glória de Deus e por trazer ao mundo muitos filhos que viessem a consagrar-se - todos! ao serviço do Senhor.
Estes dois operários da arte, o relojoeiro e a fabricante de rendas, não moravam no mesmo bairro e suas famílias não se conheciam. Ignoravam-se mutuamente, aguardavam-se mutuamente. Certo dia, passaram-se um pelo outro na Ponte de São Leonardo; os seus olhares se cruzaram, ele afastou-se para deixá-la passar, e Zélia Guérin reconheceu, sem sombra de dúvida, que aquele era o marido que Deus lhe destinava. Ambos, na verdade, o adivinharam, simpatizaram um com o outro, as famílias passaram a relacionar-se e a união matrimonial seguiu-se naturalmente.
Cioso de sua própria virgindade e presumindo que a sua esposa desejava também preservar a sua
sob o véu de um matrimônio inteiramente espiritual, Luís Martin viveu com ela por um ano - há documentos que o atestam - como um irmão com uma irmã. Este paradoxo poderia ter durado toda a vida, mas nesse caso Teresa não teria nascido... e não era outra, ao que parece, a finalidade desse matrimônio no plano da Providência.
Foi necessário que Zélia confessasse ao marido o seu desejo de ser mãe, de com ele gerar uma descendência de santos, para que Luís deixasse de lado o seu desejo de virgindade.
E o anelo da Sra. Martin foi satisfeito: dos nove filhos que teve, quatro foram alegrar a corte celestial quando tinham entre seis meses e seis anos, e as cinco restantes entraram para o convento.
Todos os filhos receberam o nome de Nossa Senhora como primeiro nome de batismo: chamaram-se sucessivamente, Maria Luísa, Maria Paulina, Maria Leônia, Maria Helena, Maria José Luís e Maria José João Batista, Maria Celina, Maria Melânia Teresa e, enfim aquela que deveria ser Santa Teresa de Lisieux. Helena, Melânia e os dois Josés - os dois filhos homens tão desejados, de quem os pais esperavam que viessem a tornar-se missionários - foram o que o Céu chamou em primeiro lugar. Das filhas que restaram, Maria Luísa - chamada simplesmente Maria, por ser a mais velha - não estava longe dos catorze anos quando nasceu a caçula Teresa.
Nesse meio tempo, estourou a guerra franco-prussiana. A pequena fabrica de rendas que Zélia Guérin havia fundado, e que não deixara de dirigir nesses anos, tinha adquirido, graças ao senso prático da proprietária, uma tal extensão que, em 1870, o sr. Martin vendeu sua relojoaria para ajudar a esposa nesse trabalho, cada dia mais absorvente. Nada o retinha na rua Pont-Neuf, pois seu pai já falecera; mas, pouco antes de mudar-se, ainda sofreria lá a miséria da ocupação alemã e, se não o houvessem impedido, ter-se-ia juntado aos franco-atiradores que ainda resistiam ás tropas inimigas.
Quando o seu sogro também morreu, o sr. Martin herdou a casa da rua Saint-Blaise, e a família ali se agrupou. Ei-nos de volta ao futuro berço da Santa.
Pouco depois, falecia Maria Helena, com cinco anos e meio, e a irmã da Sra. Martin, religiosa do mosteiro da visitação de Mans, escrevia-lhe candidamente:
"Não posso deixar de pensar que és feliz por poderes dar ao Céu algumas almas eleitas, que serão a tua alegria e a tua coroa. Além disso, a tua fé e a tua confiança, que nunca vacilam, receberão algum dia uma magnífica retribuição... Deves estar certa de que o Senhor te abençoará, e de que a medida das tuas alegrias será a das consolações que hoje te são recusadas; pois se Deus, contente contigo, quer dar-te assim esse grande santo que tanto desejaste para glória dEle, não estarás muito bem recompensada?"
Mons. Laveille, um dos melhores biógrafos de Teresa, relaciona estas palavras com as que a sr. Martin dirigiu á sua cunhada de Lisieux após um luto semelhante:
"Ao fechar os olhos das minhas queridas filhinhas e sepultá-las, senti muita dor: mas foi sempre uma dor resignada. Não lamentei as penas e preocupações que sofri por elas. Toda a gente me dizia: << Teria sido muito melhor que não tivessem nascido>>. Nunca pude suportar essa linguagem: não creio que as penas e preocupações possam ser pesadas na mesma balança que a felicidade eterna dos meus filhos".
Pode-se avaliar por esta amostra a medida de fé de Zélia Martin. Há quem pense ter ela sido favorecida algumas vezes com graças extraordinárias - conselhos, pressentimentos, iluminações -, tão transparente era a sua alma. Era uma mãe que cultivava o sonho de dar ao mundo "um grande santo".
Retirado do livro: Teresa de Liseux, de Henry Ghéon.
A Santa Família Martin |
PS. Próximo de sua morte, Luís Martin, após alta de onde estava internado, e já com as pernas paralisadas, foi levado ao Carmelo de Lisieux para visitar suas filhas: “[...] ele não consegue falar, mas parece entender todas as palavras das filhas. E quando elas lhe dizem até logo, ele ergue o dedo indicador e consegue articular: ‘No Céu!’”. Olhemos para eles, modelo santo de casal e de família, e vivamos e rezemos como rezam os santos rumo ao Céu!
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