Meu Deus eu Creio, Adoro, Espero e Amo-Vos. Peço-Vos perdão para todos aqueles que não creem, não adoram, não esperam e não Vos amam.

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Formação Católica

01 outubro 2016

SANTA TERESA DO MENINO JESUS - VÍTIMA DE HOLOCAUSTO



Vitima de Holocausto.

Aos vinte e dois anos, atingiu a perfeição dos maiores santos, mas quase ninguém suspeita disso, porque "não a vêem praticar a virtude" ou, melhor, porque dá a impressão de se deixar levar, de não ter mérito algum, de se deixar arrastar pela sua própria natureza. Ninguém sabe das lutas que teve de sustentar e que ainda sustenta a cada momento do dia: a uniformidade do seu humor as dissimula. Ao vê-la sorridente, as outras acham que está "inundada de consolações", e algumas certamente pensam: "Ah, se me tratassem assim!"... As poucas que a conhecem a fundo têm medo da sua excessiva entrega: recusam-se a admirá-la, pois se o fizessem teriam de imitá-la. O melhor, então, será considerá-la, com certa displicência, como uma freirinha meticulosa e simpática que se dá bem com as suas noviças, conta histórias encantadoras, pinta belas imagens e escreve versos agradáveis. A sua santidade não está em pauta. Teresa obteve, assim, o resultado que esperava: as suas irmãs de religião a ignoram.

E Deus a ignora também, embora seja seu único confidente; ou, pelo menos, finge ignorá-la. E é justamente isso que dá a Teresa tanta audácia para assaltá-lo: Quanto mais Ele se esconde, mais ela o quer; quanto mais Ele a menospreza, mais ela se oferece.

Não devemos, por outro lado, exagerar a solidão em que o Senhor a deixa. Prova disso é uma confidência, feita à Madre Inês, que parece relacionar-se com o tempo em que ainda era noviça. - "Sim, muitas vezes, no jardim - afirma Teresa -, no tempo de silêncio da noite, durante o verão, sentia em mim um recolhimento tão grande, tinha o coração tão unido a Deus, formava com tanto ardor, e contudo sem nenhum esforço, tamanhas aspirações de amor, que me parece que essas graças eram o que a nossa Madre Santa Teresa chama de "vôos do espírito"... Havia como que um véu entre mim e as coisas da terra. Estava completamente escondida sob o véu da Santíssima Virgem. Já não estava na terra, e fazia tudo o que tinha de fazer [...] como se me tivessem emprestado um corpo". Eram, certamente, graças excepcionais, de que Teresa se nutria por muitos dias, numa profunda quietude, antes de "despertar".

A nove de junho de 1895, festa da Santíssima Trindade, Teresa complementa durante a Missa, num grande impeto, a oferenda que costumava fazer todos os dias a Deus; é o seu Ato de oferenda como vítima de holocausto ao Amor Misericordioso de Deus.

A justiça de Deus precisa de vítimas, mas quem ousa confiar-se ao seu amor? "Por toda a parte Ele é desconhecido e rejeitado". Os corações voltam-se para as criaturas, "pedindo-lhes a felicidade em troca da miserável afeição de uns momentos". "Ó meu Deus, o vosso amor desprezado terá de permanecer encerrado no vosso coração?" Não ficaria Deus feliz se tivesse de reprimir "as chamas da sua ternura infinita", se pudesse consumir as almas pelo amor? Se a sua justiça gosta de manifestar-se, uma justiça que somente diz respeito à terra, quanto mais não o fará o seu amor de misericórdia, "uma vez que se eleva até aos Céus"? Teresa diz-lhe, portanto, no seu coração: "Jesus, que seja eu essa vítima feliz!"

Mas uma religiosa não tem nenhum direito, nem mesmo o de oferecer-se a Deus por vontade própria, sem a permissão da Madre Priora. Terá a Madre Inês julgado sem importância, e como que supérfluo - uma infantilidade mística -, este ato de doação? Seja como for, aquiesceu sorrindo. E então,para comprometer-se mais fortemente, a vítima do holocausto passou a escrito o seu juramento. Conseguiu que um sacerdote versado em teologia lhe revisse os termos, tal como se submete um testamento a um tabelião a fim de não introduzir nele alguma cláusula que seja nula, e depois guardou-o no exemplar dos Santos Evangelhos que noite e dia trazia consigo.

A glória de Deus e da Igreja, a salvação e a libertação das almas, o cumprimento da vontade de Deus, esses são os seus desejos. E também o de "ser santa". Mas sente a sua impotência, e pede a Deus "que seja Ele próprio a sua santidade". Oferece-lhe os méritos de Jesus, dos santos e da Santíssima Virgem. Suplica-lhe que elimine nela " a liberdade de lhe desagradar". Espera alcançar o Céu, mas não quer simplesmente amontoar méritos para obtê-lo. Só o amor de Deus, só o agrado de Deus, só a consolação de Deus, essa é a sua única exigência; e Teresa será, então, a mártir do amor divino.


Acrescenta também essas frases sublimes: "Que esse martírio, depois de me ter preparado para comparecer diante de Vós, me faça enfim morrer, e que minha alma se lance sem demoras no eterno abraço do vosso amor misericordioso." 

"Quero, meu Bem-Amado, renovar esta oferenda em cada latejo do meu coração, um número infinito de vezes, até que, desvanecidas as sombras, possa voltar a proclamar o meu amor por Vós num eterno face a face".

Lê-se, ao pé, a sua assinatura: "Religiosa carmelita indigna".

Recitava com frequência este ato. Guardou absoluto segredo a respeito dele, a não ser com duas das suas filhas. As demais certamente teriam rido dela.

Ora, o fogo de amor que ela reclamava veio realmente a abrasar a sua alma, como uma realidade mística, como uma realidade física, como a flecha com que o serafim atravessou o coração de Santa teresa de Ávila. Alguns dias depois - quem o narra é a própria Teresa, cuja via crucis ia começar-, sentiu-se de repente "ferida por um dardo de fogo tão ardente que pensei morrer". Procurou em vão uma comparação que permitisse "fazer compreender a intensidade dessa chama". "Parecia-me que uma força invisível me mergulhava toda inteira no fogo. Oh que fogo", que doçura"... Um minuto, um segundo mais, e a minha alma ter-se-ia separado do corpo".

Em breve recairia novamente "na sua habitual aridez". Mas como o amor a visitara, pode viver daí por diante no contínuo exercício da caridade, mesmo sem lhe provar as delícias. Pouco importava! Ela já não era mais ela. jesus vivia e sofria nela, acabava de destruí-la a fim de ocupar, sozinho, o seu lugar.

Primeiro assalto da enfermidade

O assalto da doença foi brutal, mas não surpreendeu Teresa. Ocupados com a sua grande alma, nada dissemos acerca do seu frágil corpo, que tomava parte nos seus trabalhos, privações e sofrimentos, e em tantas outras cargas que não deixavam de cansá-lo.

A observância da regra, a disciplina, o jejum, a ginástica da salmódia, os trabalhos de limpeza, as horas de oração de joelhos, o propósito de não se apoiar na parede mesmo em casos de extrema fadiga, de jamais se acomodar, mesmo na cela, numa posição de repouso, de manter em seus passos uma firmeza invencível, de apressar-se ao menor sinal, de subir e descer vinte vezes por dia longas escadas, de suportar o calor e sobretudo o frio - num clima úmido, entre paredes geladas dentro das quais escorre a água -, e, acima de tudo, a recusa obstinada de pedir ou mesmo aceitar qualquer dispensa, ou de se permitir em todos esses exercícios um segundo sequer de atraso ou relaxamento... Não estaria esse fardo a exigir do corpo de uma jovem, ainda que robusto e bem constituído, um dispêndio de forças que ultrapassava de longe os seus recursos, principalmente se não era bem alimentado e não dispunha de um tempo de sono suficiente?

A ação conjugada da vontade e da graça conseguirá manter o corpo de Teresa em estado de sobre-excitação, mascarando pelo menos por algum tempo a sua deterioração e o seu declínio. Mas tinha de chegar o dia em que a vontade e a graça já não seriam suficientes. A estafa diária acabaria por vencer as resistências de Teresa, e, quando ela tomar consciência disso, não se resolverá a confessá-lo.

Vai-se, pois, tornando pálida e fraca. Quando sobe uma escada pensando que ninguém a vê, agarra-se à parede ou ao corrimão. Cai no sono durante a oração; esfalfa-se com facilidade e começa a suas; a menor corrente de ar deixa-a gelada.

Nos sete anos que passou no claustro, à exceção de alguns meses de verão, jamais deixou de sentir, frio, frio "até à morte", no coro, no jardim, no noviciado, no refeitório, no capítulo, na cela. Só se acende a lareira no auge do inverno, na sala comum onde tem lugar o recreio, mas mesmo então teresa aproveita-se disso o menos possível: não quer fazer nenhuma concessão a sua sensibilidade excessiva, pois se Deus lha deu, foi porque desejava servir-se dela.

Sete anos de frio, sete anos de privações, sete anos de hipertensão nervosa e de cansaço - e quantas indisposições passageiras, sempre tratadas com menosprezo! Este é o balanço da vida de seu corpo; quanto a alma, já conhecemos as penas e os trabalhos por que teve de passar. Além disso, escondeu tão cuidadosamente o seu estado, que ninguém se lembrou de impor-lhe uma hora de descanso em nome da obediência.

Voltou, pois, a penar sob o governo exigente e caprichoso da Madre Maria de Gonzaga, que tornara a encarregá-la sacristia. Na noite de 3 de abril, após os belos e extenuantes ofícios da Quinta-feira Santa, sentindo-se forte, "mais forte do que nunca", ouviu "como que um longínquo murmúrio anunciando-lhe a chegada do Esposo".

Esta é á figura de linguagem que emprega para relatar um fato que, na verdade, foi brutal. Vendo-a muito cansada, a Madre não lhe permitira permanecer velando o Monumento durante toda a noite, e Teresa foi deitar-se a meia-noite. Assim que recostou a cabeça sobre o duro travesseiro, "sentiu uma golfada subir-lhe borbulhando aos lábios". Naquele momento, pensou que ia morrer, e "o seu coração partiu-se de alegria"; não quis, porém acender a lamparina, "mortificou a curiosidade até o amanhecer" e adormeceu tranquila. Ás cinco da manhã, quando despertou, pressentindo uma grandíssima felicidade, aproximou-se da janela e verificou que o lenço que levara aos lábios na note anterior estava completamente vermelho. Era o dia da morte do Senhor.

Com grande fervor, assistiu as orações da prima e ao capítulo, e foi depois ajoelhar-se diante da Madre para contar-lhe o fato. Por outro lado, não tinha dores nem sentia mal-estar algum. A reverenda Madre, ainda que um pouco alarmada, autorizou-a no entanto - graças à insistência de Teresa - a viver normalmente as penitências da Quaresma nos dois dias que faltavam. O pão e a água do jejum, as longas genuflexões das cerimônias e as orações redobradas naquela casa temporariamente despojada de Deus na Eucaristia, nada disso lhe custou e tudo a encantou. Chegou mesmo a limpar as janelas, recusando a ajuda de uma das suas noviças que, assustada com a sua palidez, lhe ofereceu o seu auxílio. Na noite seguinte, teve uma nova hemoptise. Era o Sábado Santo: Jesus ressuscitava e o Céu ia abrir-se.

O Céu não tem pressa

Mas o céu tinha menos pressa do que ela. Sem contemplações para com o seu corpo, Teresa não esmoreceu no seu trabalho.

A 10 de maio, ao alvorecer, teve um sonho maravilhoso: estava passeando por uma galeria, acompanhada apenas pela Madre Priora, quando percebeu três carmelitas com véus e capaz brancas que pareciam ter descido do Céu. Uma delas ergueu o véu, e Teresa pode reconhecer a venerável fundadora do carmelo da França e antiga companheira de Santa Teresa de Ávila, a Madre Ana de Jesus. O seu belo rosto resplandecia "com uma luz que parecia irradiar dela mesma. - Madre, perguntou-lhe Teresa, Deus virá procurar-me logo? - Logo, respondeu-lhe a Madre Ana. - E Ele não pede outra coisa além das minhas pobres e pequenas ações e desejos? - Nenhuma outra coisa. - Ele está contente comigo? - Muito contente". E no momento em que a Madre a cumulava de carícias, Teresa despertou.

Preferiu não contar nada às suas três irmãs, a fim de poupar-lhes o sofrimento; mas, poucas semanas depois, viu-se traída por uma tosse seca e frequente, que em vão tentava abafar. As três começaram a inquietar-se e alertaram a Madre Priora, que mandou chamar dois médicos, um dos quais era o Dr. Neèle, marido de Joana Guérin. Mesmo sem terem conseguido descobrir nada de especial pela auscultação, ambos prescreveram um enérgico tratamento com todos os revulsivos então em uso, do vesicatório às pontas de ferro em brasa, e com fortificantes. A tosse parou e as cores voltaram ao rosto de Teresa - por alguns meses, pelo menos-;pôde, assim, retornar às suas atividades.

"Pedes-me notícias da minha saúde" - escreve à sua irmã Leônia, a 12 de julho. "Pois bem: já não estou tossindo. Ficas contente? Mas isso não vai impedir Deus de me levar quando bem quiser. Como faço todos os esforços para ser uma criança bem pequenina, não tenho preparativos a realizar; será Ele mesmo quem terá de pagar todos os gastos da viagem e o preço da entrada no Céu".

É ainda nesta carta que diz, citando o Cântico dos Cânticos: "Como temer Aquele que se deixa prender por uma mecha de cabelo que esvoaça ao redor do nosso pescoço?" Esforça-se por ser paciente, mas suspira por dentro. Por aqueles dias, diz a uma noviça: "Verdadeiramente a doença é uma condutora demasiado lenta... Só confio no amor".

A Madre Inês de Jesus, livre das preocupações e pesos do priorado, conseguiu por fim um pouco de tempo disponível para percorrer o manuscrito redigido para ela, e acabou por compreender, se ainda não o fizera, o valor excepcional dessa alma que ela, Paulina, havia formado ou pelo menos despertado nos Buissonnets. É de supor que tivesse emprestado a Maria o precioso caderno, repelto com o passado comum de ambas, pois no mês de setembro Maria pediu a Teresa, com autorização da Priora, que lhe escrevesse também alguma coisa para ela: concretamente, uma exposição da "pequena via". Teresa acedeu prontamente, e escreveu numa penada as breves e ardentes páginas que formam o décimo-primeiro capítulo da História de uma alma, que é portanto nove meses anterior aos capítulos nono e décimo. Nessas páginas, depois de um cumprimento à sua "madrinha", aquela que um dia a oferecera ao Senhor, Teresa passa a descrever essa fornalha de amor, o único caminho que pode conduzir os homens a Deus: o abandono nos seus braços.

"Se alguém é muito pequeno, diz Salomão, que venha a mim! O amor prova-se pelas obras, mas quais podem ser as obras de uma criancinha? Lançará algumas flores, buscará flores sob os espinhos, irá colhê-los rente a terra, na ramagem das mais humildes ações. O amor de Deus por nós derramou-se até a loucura: mas que loucuras pode praticar uma pobre criaturinha feita para arrastar-se pelo chão? Terá de abraçar a loucura de Deus; tomará de empréstimo as asas da Águia soberana, as próprias asas soberanas, para voar ao seu encontro - algum dia. Não se trata apenas de um desejo insensato. Pelo contrário, nada é pequeno demais para a infinita Misericórdia. Se Deus, por um absurdo, encontrasse no meio da multidão das almas uma que fosse mais fraca que a dessa criança, Ele a cumularia de dons maiores, desde que ela se abandonasse.

Excerto do Livro; Teresa de Lisieux - Henry Guéon. Páginas 127 a 130, 134 a 138. 

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