As heroicas almas do Carmelo de Lisieux no tempo de Santa Teresinha. |
Antes de entrarmos nesta parte da história desta vida heroica e admirável de Santa teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face, é mister, saiba o leitor o que é a vida num Carmelo. Há tanta ilusão e tanto preconceito sobre a vida religiosa! Uns a romantizam, e a julgam um refúgio de desiludidas, outros nem suspeitam sequer o grau de virtude, a abnegação e o espírito de sacrifícios exigidos de uma carmelita para se santificar na obediência à regra austera de santa Teresa d'Avila. Só esta observância fiel basta para elevar uma alma à perfeição e transformá-la num anjo de oração e penitência.
Os que olham a Santa de Lisieux apenas como a "Santinha das Rosas", cuja vida foi toda suave e bela num hábito de Carmelita, e que morreu com um sorriso nos lábios, não podem adivinhar quantos espinhos se ocultam entre as rosas de Santa Teresinha! E dentre estes espinhos, não foram menos dolorosos os da observância da Regra do Carmelo. Nunca se compreenderá bem Santa Teresa do Menino Jesus sem se conhecer a vida de um Carmelo e o ideal de uma Carmelita. A menina de 15 anos postulante, e, noviça ao dezesseis anos, nunca se afastou do seu sublime ideal: - "amar a Jesus como jamis fora Ele amado na terra", e realizar o seu desejo ardente de zelo apostólico: - "Salvar almas, almas de pecadores e santificar os sacerdotes pelo sacrifício, a oração na observância da Regra do Carmelo."
Teresa, vimos mais atrás, não teve ilusão alguma antes de transpor os umbrais do Convento. Ela compreendera toda a austeridade da Regra Carmelitana, todos os sacrifícios e cruzes que a esperavam. Apesar de tão nova e numa idade em que as ilusões são tão naturais numa cabeça e num coração de menina, ela sabia admiravelmente o que devia ser uma Carmelita. Daí a surpresa que causou no Mosteiro a fidelidade, o espírito de observância, a compreensão das virtudes e deveres monásticos, já tão perfeitos e tão elevados em Soror Teresa do Menino Jesus. É um fato impressionante e que só bastaria para a colocar entre as grandes Santas da Igreja: - Jamais as Carmelitas de Lisieux puderam ver em Soror Teresa, uma só transgressão da austera regra do Carmelo, em nove anos passados no Mosteiro.
Teresa possuía uma alma de escol, um coração delicado e sensível e a saúde frágil. Pois, contudo, a austeridade da Regra não lhe foi mitigada em um só ponto. Madre Maria Gonzaga, a priora, autorizou-a a seguir integralmente todos os exercícios e não lhe fez exceção alguma nem mesmo quanto aos jejuns.
As companheiras de Noviciado notavam-lhe as vezes a palidez e procuravam pedir a Priora dispensa dos ofícios noturnos ou de levantar muito cedo, em favor de Soror Teresa. A resposta era sempre a mesma: - "Não. As dispensas não são feitas para uma alma daquele tempera, deixai-a. Deus a sustenta. E se ela estiver doente que venha me dizer".
A fervorosa e santa noviça, porém, tinha como norma a de Santa Teresa d'Avila: "Ir até onde puderem as forças antes de se queixar".
O Carmelo de Lisieux |
A Carmelita vive em perpétua clausura. Fechada atrás das grades austera do Mosteiro. Estas grades de ferro ainda tem por detrás um longo véu espesso e de cor escura, de modo que ninguém chega a ver as monjas. No locutório, como na Capela, rezam, conversam sem serem vistas. Apenas em circunstâncias excepcionais e para a família e os mais íntimos é permitido falar nas grades do locutório sem a cortina. Observam rigorosamente a regra da Clausura Monástica-
"nec videre, nec videri - nem ver nem ser vista".
As grades do coro dão para o altar mór da Capela ao lado direito e atrás delas um véu escuro, porém transparente para deixar ver as cerimônias. Clausura perpétua. A Carmelita nunca mais sai do Mosteiro em que voluntariamente professou. É a regra geral. Uma vez abandonado o mundo e recolhida naquela Arca-Santa, como a chamava Teresa, jamais poderá ver ou viver as agitações da vida aqui de fora.
Realiza-se a palavra de São Paulo: - "Está morta e escondida em Cristo Jesus." Quando, por qualquer motivo necessário devem se apresentar sem serem vistas por estranhos ao Mosteiro, descem o véu sobre o rosto, e ocultam a face. Dentro do Mosteiro, além dos limites da Clausura, ninguém pode passar, sob penas canônicas muito severas. Apenas o médico, operários, jardineiro, etc., em serviço das profissões.
A Carmelita observa uma das Clausuras mais rigorosas da vida Monástica. Quando, encantada pelas belezas das montanhas da Suíça, a Teresinha contemplava as maravilhas do céu, lembrava-se então da austera Clausura do Carmelo:
"Como posso descrever as impressões que em mim despertava aquele espetáculo tão poético e tão grandioso? Antevia, escreveu ela, então, as maravilhas do céu..."
Representava-me a vida religiosa tal qual é na realidade, com o seu cortejo de sujeições e de pequenos sacrifícios quotidianos praticados na solidão. Compreendia quão fácil é, então, descer do primitivo fervor, recuar, e esquecer o fim sublime da própria vocação e refletia comigo: "Mais tarde, nas horas de provação, quando prisioneira no Carmelo, já não puder descortinar mais que um pedacinho do céu, recordar-me-ei do dia de hoje; a lembrança deste quadro me infundirá coragem. Nenhum caso farei já dos meus mesquinhos interesses, lembrada da grandeza e do poder de Deus; a Ele só hei de amar e não terei a fraqueza de me apegar a coisas de nada, depois que o meu coração entreviu o galardão que reserva para quem deveras o ama".
A cela de Teresa. |
O silêncio foi e será sempre uma das bases da vida ascética. Os Mosteiros Carmelitanos são oásis de recolhimento em meio do barulho ensurdecedor da vida no mundo. A alma de Teresa sentia necessidade deste silêncio para amar a Jesus e se imolar pelos pecadores e a santificação dos sacerdotes, para viver de meditação"...
A Carmelita passa todo o seu dia no mais profundo silêncio absoluto, a exceção apenas de duas horas de recreio.
Há um depoimento no Processo de Canonização de Santa Teresinha, escreve o Pe. Petitot, O.P., que mereceria ser escrito em letras de ouro no frontispício de todas as obras sobre a vida ascética do Anjo de Lisieux:
"O seu grande meio para a perfeição era o silêncio. Tinha-o aprendido da Santíssima Virgem, cujo exemplo a arrebatava de admiração, principalmente quando a Virgem preferiu sofrer uma suspeita a desculpar-se junto de São José, revelando-lhe o Mistério da Encarnação. Como Maria, gostava de guardar tudo no coração, alegrias e tristezas. Esta reserva foi a sua força e o ponto de partida da sua perfeição, como também o selo exterior que a distinguia do comum pela grande ponderação".
Nos primeiros dias de entrada no Carmelo deram lhe como guia para lhe ensinar a rezar o Ofício Divino, a Irmã mais velha, Soror Maria do Sagrado Coração. Três semana depois Teresa a dispensava: - Minha Irmã, agradeço-lhe a caridade. Gostaria tanto de conversar com a senhora, mas devo me privar desta consolação. Já não estamos mais nos "Buissonnets". A jovem Carmelita dava lições de observância fiel ao rigoroso silêncio do Carmelo.
Observemos ainda que além daquelas duas horas de recreio a Carmelita só pode falar, em absoluta necessidade, e há um código de gestos para traduzir o que deseja ou precisa, sem quebrar o silêncio.
As irmãs Martin com a Madre Maria de Gonzaga, em fotografia de 1894. Teresa aparece sentada em primeiro plano, à direita, com Maria a seu lado; de pé estão Celina (à esquerda) e Paulina (à direita). |
O Carmelo é a montanha santa onde, como no Sonai, a filha de Santa Teresa ora e sofre pelo mundo pecador. Duas horas de profunda meditação, uma pela manhã e outra a tarde após o "Angelus" ajoelhadas no "coro" diante do Santíssimo Sacramento.
A Carmelita está obrigada como os sacerdotes, a recitação do Breviário ou Ofício Divino. A salmódia é o encanto das almas desejosas de viverem unidas a Igreja pela oração pública e universal do Ofício. Longo tempo dividido pelas horas canônicas, passam as Carmelitas no coro a entoar louvores a Deus. Observam fielmente todas as prescrições litúrgicas do Divino Ofício. Se erram ou se distraem a ponto de perturbar a oração, são logo punidas com algumas penitências. Dentre estas a maior é a prostração completa com os braços em cruz e estendida no pavimento sagrado. Teresa achava na oração do Ofício Divino, o enlevo de seu coração abrasado no desejo de amor a Nosso Senhor.
As carmelitas em um de seus afazeres diários. |
A vida no Carmelo é toda de oração e penitência. A regra prescreve austeridades cuja prática exige almas fortes e generosas. O jejum vai da Festa da Exaltação da Santa Cruz, em 14 de Setembro até a Páscoa, sem contar os jejuns da Igreja e as Vigílias. Nunca podem comer carne, a não ser um caso de enfermidade. Há jejuns a pão e água na semana Santa. As Carmelitas tomam a disciplina que fere o corpo já tratado com tamanha austeridade. Estas disciplinas em que os açoites são tão doloridos, Teresa as tomava com todo rigor e muitas vezes as lágrimas de dor brotavam-lhe dos olhos. Em tudo queria a perfeição. Fazia com que tal disciplina a mortificasse o mais possível.
As prescrições do Carmelo são mortificantes para a natureza. Não permitem qualquer conforto. Assentam-se as monjas sem se encostarem, passam longo tempo de joelhos. Repousam sobre os calcanhares sem cadeiras ou poltronas. Executam trabalhos grosseiros de cozinha, lavanderia, e asseio da casa.
O alimento é grosseiro e de pobre em uma só refeição, embora forte e substancial. A cela de uma Carmelita é paupérrima. Um enxergão sobre três tábuas duras e uma grossa manta que a cobre, e tanto serve para frio como para o calor. Uma cruz nua à parede. Nesta cela pobre e sem conforto passa a monja em recolhimento, oração e trabalho, boa parte do dia.
Deita-se depois das 23 horas, após haver recitado o Divino Ofício no coro e às quatro e quarenta e cinco da manhã já está de pé para recomeçar a luta. Em jejum absoluto recita o Breviário, assiste a Santa Missa e recebe a Santa Comunhão. Só vai tomar a primeira refeição às onze horas.
O hábito que traz é grosso e pesado, muitíssimo sem conforto. Teresa tão delicada e frágil sentia grande incomodo dentro daquele enorme burel. No tempo de calor é extremamente quente e no frio não aquece suficientemente. Enfim, a vida no Carmelo é toda crucificante para a natureza. As observâncias da regra de Santa Teresa foram feitas de molde a formar almas heroicas e santas.
No Carmelo se celebram todas as solenidades do Ano Litúrgico, algumas delas com cerimoniário próprio da Ordem. A Semana Santa tem nos Mosteiros Carmelitanos especial fervor. Penitências, austeridades peculiares sobretudo no grande Tríduo.
A guarda do Sacramento Augustíssimo e de toda noite de Quinta para Sexta-feira Santa, em que passam as monjas acordadas. Começam as cerimônias da grande Semana pela benção dos Ramos e a Procissão de Ramos no interior do Convento. Há piedosas procissões litúrgicas, como a das velas no dia 2 de fevereiro, e outras extra-litúrgicas em honra da Virgem Santíssima, embora estas mais raramente.
Eis a vida austera de um Carmelo. Acrescentemos a tudo isto as mortificações voluntárias e que dependem da generosidade de cada uma, e imaginemos quanto a alma generosa de Teresa, além da fidelidade absoluta à "Regra" as teria acrescentado nas lutas heroicas e íntimas para a conquista do seu grande ideal, "Amar a Jesus para dar-lhe almas, almas de sacerdotes e almas de pecadores".
Excerto do Livro; Santa Teresinha do Menino Jesus, Monsenhor Ascanio Brandão. Capítulo XIX, "A vida no Carmelo". Páginas 200 à 206.
O Carmelo de Lisieux em fotografia de nosso tempo. |
alguém por caridade, pode me dizer a canção que está tocando?
ResponderExcluirÉ uma composição de Santo Tomás de Aquino, chamada "Adoro te Devote". Faz parte da sequência de "Corpus Christ" juntamente com o "Pange Lingua" e o "Lauda Sion".
ExcluirO modo que está sendo tocado com esse fundo com temas da natureza foi montado por um profissional chamado Dan Gibson.
Deus lhe abençoe irmão, derrame incontáveis graças pela mão da Stss Virgem pelo conteúdo dessa página. E obrigado pela resposta. ^^
ExcluirHoje é bem diferente a vida no mosteiro, não é?
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